quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Direito à Dignidade

Ao desenvolver a capacidade de apreender o mundo pela razão, o homem foi criando, ao longo da Hstória, mecanismos de proteção que garantissem seus direitos individuais e coletivos. Tal visão permitiu não apenas resguardar a liberdade e propriedade, enquanto cidadão, assim como valorizou um elemento que só o ser humano possui: a Dignidade.

O Artigo V, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 1948, garante que “ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante”. Caso este artigo fosse respeitado na íntegra, pelos países-membros das Nações Unidas, estaria a Dignidade preservada e muitos conflitos políticos e culturais poderiam ser evitados.

Além do caso da iraniana Sakineh Mohammadi Ashtiani, que foi condenada a morrer por apedrejamento pelo crime de adultério, outros episódios típicos de violação dos Direitos Humanos são noticiados todos os dias. No Afeganistão, o Talibã está sendo acusado de matar uma mulher grávida por ter cometido o mesmo crime pelo qual a iraniana responde. Chama-se Bibi Sanubar, e foi chicoteada e executada publicamente a tiros por milicianos.



A pena de morte por apedrejamento é descrito na Bíblia como uma condenação que visava reprimir o adultério para preservar o casamento e a pureza do lar. Se no Velho Testamento a Bíblia revela que a lei era cruel e sem piedade, no Novo Testamento demonstra compaixão pelas desgraças e misérias alheias: “Quem nunca pecou, que atire a primeira pedra”, disse Jesus Cristo.

A interpretação do que seja adultério depende muito do contexto social e cultural em que foram estruturadas as leis e os costumes de cada povo. Entre os esquimós, por exemplo, emprestar a esposa ao visitante é sinal de hospitalidade. Segundo a lei islâmica, denominada Sharia, uma mulher adúltera deve ser enterrada até o pescoço e apedrejada até a morte. A sentença é decretada pelos tribunais religiosos e a tarefa final do castigo cabe aos moradores da cidade, ex-vizinhos, ex-conhecidos e, especialmente, familiares da parte ofendida.

No caso da iraniana, a parte ofendida ultrapassou a esfera familiar para se tornar um problema político internacional. Segundo a líder da Comissão Internacional contra a Pena de Morte e Apedrejamento, Mina Ahadi, a execução de Ashtiani não tem nada a ver em ser justo no Irã, e sim uma ferramenta política para a opressão e autopreservação do regime islâmico. Por outro lado, países como o Brasil tomam partido da situação com intuito de defender interesses comerciais ou geopolíticos.



Com a pressão da opinião pública, o governo brasileiro fez uma proposta formal ao presidente do Irã para que Ashtiani seja trazida para o Brasil. Para justificar tal decisão, o presidente Lula disse que tem que respeitar a lei de um país, mas se essa mulher está causando incômodo ao seu amigo Ahmadinejad e ao povo iraniano, que ela venha para o Brasil. Nessa manobra política, o que se discute agora não é mais a vida e nem a dignidade da mulher, prestes a morrer apedrejada, mas quem é “o Cara” da vez.

Entretanto, se um presidente diz que os valores defendidos pelos Direitos Humanos foram formulados para reforçar a dominação Ocidental, este não está preparado para conduzir uma nação, logo está longe de ser “o Cara”. O pedido que o presidente Lula fez à ONU para que fosse mais tolerante com os países que desrespeitam tais códigos humanitários, provam que o nosso governante não está apto a opinar sobre o destino de ninguém, muito menos de um povo.

Quando o problema sai da esfera política e entra na particular, a discussão pouco muda em relação à violação da dignidade humana. Basta estar atento aos noticiários para saber como crimes acontecem e ficam por isso mesmo, impunes, sem que haja justiça. No Brasil, muitas mulheres são espancadas pelo companheiro e se calam com medo do agressor ou por vergonha da sociedade As mais esclarecidas recorrem à Lei Maria da Penha; as famosas têm apoio da mídia. O caso do ator Dado Dolabella, condenado a quase três anos de prisão, por ter agredido a atriz Luana Piovani em uma boate, divide a opinião do público.

Por ser considerado famoso, bonito e pai de família, o ator acabou sensibilizando com arte. E foi talentoso ao reconhecer a paternidade de um filho fora do casamento, antes de ser condenado por agredir sua ex-namorada Luana. Com essa atitude, Dado Dolabella passou para o público a imagem de bom-moço. A mesma estratégia está sendo usada pelo goleiro Bruno, acusado de matar a ex-amante Eliza Samudi. Segundo foi noticiado pelo jornal O Globo, Bruno autorizou o exame de DNA para saber se o filho de Eliza é dele também. Caso seja confirmado, ele disse que vai pedir a guarda da criança.

Quando Bruno decidiu por esse caminho, certamente não foi porque estava pensando somente na criança, tampouco na dignidade dele já comprometida. Na verdade, o que ele almeja é a sua liberdade de volta o mais rápido possível. Teoricamente, essa liberdade foi colocada ao alcance de todos pela Declaração dos Direitos Humanos, uma conquista do homem pela Razão. Mas que razão teria a vida, se não pudéssemos gozá-la dignamente?
 
Por Maria Oliveira

Publicado em Julho de 2010

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