terça-feira, 27 de julho de 2010
Lugar de criança é na escola?
A escola, ao tomar para si o objetivo de formar cidadãos capazes de atuar com competência e dignidade na sociedade, conquistou a confiança das famílias que, ao deixarem seus filhos neste lugar teoricamente seguro, acreditam que possam seguir tranquilamente suas rotinas. Entretanto, se antes a ideia era confinar a criança em tempo integral na escola para afastá-la da violência das ruas, hoje, o lugar dito seguro, está com os dias contados.
O caso do menino Wesley, de 11 anos, que foi morto por uma bala perdida durante uma aula de matemática, e câmeras instaladas em banheiros com o objetivo de flagrar o uso de drogas por alunos de um colégio de Campos, colocam no centro do debate a questão da segurança nas escolas, e a volta da vigilância nos espaços de circulação dos alunos.
Escolas particulares contratam inspetores disciplinadores que ajudam a garantir a ordem no colégio. Estes se encarregam das cadernetas, coordenam a entrada e saída dos alunos, vigiam banheiros e recreio. Se houver algum desvio, o discente é punido segundo as normas estabelecidas pelo regimento interno do estabelecimento de ensino. Tais inspetores acabam exercendo controle e poder sobre os alunos, o que os torna pessoas indesejáveis e temidas na escola. Ao contrário das particulares, a maioria das escolas públicas do Rio já dispensou os inspetores de turmas. As professoras lamentam porque ficou muito mais difícil controlar o recreio e demais espaços da escola. Os alunos estão mais rebeldes, reclamam os docentes.
Por outro lado (da escola) o Governo cria uma politica de segurança que, segundo o governador do Rio, Sérgio Cabral, tem uma ação clara de reconquistar territórios dominados por traficantes e milícianos. “Para que meninos como wesley não mais coloquem na redação o temor aos tiros”- completou o governador. Entretanto, admitir que a estratégia da PM foi errada, ao tirar a vida do menino, não ameniza a dor da família. Afinal, “ele estava no lugar certo, na escola“, como lembrou bem o padrasto de Wesley.
Se dentro das escolas os inspetores devem ser parceiros dos professosres e dos alunos, e não carrascos disciplinadores, nas ruas, os policiais deveriam dar a segurança que o cidadão precisa para circular em todos os espaços públicos. Mas isso demanda uma boa formação profissional e humanitária, além de uma remuneração digna à altura do risco que o trabalho exige. Mesmo assim, nada justifica uma ação desastrosa.
No confronto com os bandidos, nos arredores do Ciep onde o estudante foi morto, os tiros desferidos pelos policiais lembram a Guerra do Golfo. Nesta, mísseis autodirigidos lançados de surpresa, vindos do nada e desaparecendo imediatamente de vista, substituíram os avanços territoriais das tropas de infantaria e o esforço para expulsar o inimigo de seu território. Tal estratégia equivale a atingir e correr, mas não de resolver.
Resolver um problema exige estratégia e planejamento. Nem sempre o meio mais prático pode levar ao sucesso da ação. E foi pelo meio eletrônico, e não colocando inspetores, nem policiais, que o colégio de Campos tentou descobrir se os alunos usavam drogas. A direção escondeu câmeras nos banheiros, fato que deixou pais e criminalistas indignados pela violação de privacidade de seus filhos. Este episódio retoma o debate sobre as novas formas do poder tecnológico.
A partir da inovação tecnológica de vigilância, tal poder não mais se limita ao espaço, nem mesmo a pessoas. Com o advento das câmeras de segurança, conectadas a circuítos internos de TV, os detentores do poder ganharam autonomia com a vantagem de permanecerem no anonimato. Não importa mais onde está quem dá a ordem e quem vigia. Esta é a era pós-Panóptica.
O projeto do Panóptico, de Jeremy Bentham, como arquimetáfora do poder moderno, foi amplamente discutido por Michel Foucault. Em seu livro Vigiar e Punir, o autor explica que, no Panóptico, os internos ficavam presos ao lugar e impedidos de qualquer movimento, confinados entre muros grossos, densos e bem-guardados e fixados a suas camas, celas ou bancadas. Eles não podiam se mover porque estavam sob vigilância. Tinham que se ater aos lugares indicados sempre, porque não sabiam, e nem tinham como saber, onde estavam seus vigias que, livres, podiam se mover à vontade.
Por ser uma estratégia cara, o Panóptico traz algumas desvantagens. Além da necessidade de erguer fortalezas para os internos, existe a manutenção administrativa e a remuneração dos profissionais encarregados da vigilância. Sendo assim, o sistema de segurança eletrônico ficou ao alcance de qualquer instituição que se disponha colocar o cidadão em observação permanente. Por conta disso, mesmo não tendo ainda aderido ao sistema de câmeras, muitas escolas dispensaram inspetores de turmas por questões econômicas.
Economizar na Educação significa não ter compromisso com o social. A segurança de escolas, em áreas de risco de violência, deveria ser prioridade antes de qualquer sinal de confronto policial. Alunos suspeitos de usarem drogas precisam de profissionais que possam atuar como orientadores e psicólogos, e não de câmeras para vigiá-los. Enfim, se lugar de criança ainda é na escola, que esta seja cuidada por todos.
Por Maria Oliveira
Publicado em Julho de 2010
1 comentários:
A questão foi muito bem colocada nesta publicação. Penso que a sociedade está sofrendo o pior dos males que é a falta de educação, tanto dentro dos lares como nas escolas, o estresse a ansiedade fazem parte da rotina das cabeças pensantes do amanhã. a produção de conhecimento multiplicou, mas as novas gerações não estão sendo formadas para pensar e sim para repetir oque se fala na televisão.Precisamos formar crianças e adolestes sociáveis, felizes, livres e empreendedores não imitadores do mau exemplo, mais ainda não foi entendido que a escola construtivista seria formadora desta moderna e liberta geração. Sem educação não se constroi um País, é lamentável o momento que vivemos, não vejo as autoridades empenhadas em soluções inteligentes.
27 de julho de 2010 às 16:50Mais pessoas como você tia, não podem se calar, a senhora conhece o nosso ensino como educadora, pesquisadora e jornalista, acreditamos muito em pessoas como você para plantar sementes para esta nova geração, temos que acreditar !
É isso tia, Muito bem !
maravilhoso texto !
Luiz Carlos.
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