terça-feira, 21 de setembro de 2010
Dor que não cabe no peito
Amor e ódio afetam profundamente nossa saúde. Situações de extrema angústia, como perda amorosa e discussões acaloradas, causam estresse e produzem no organismo reações semelhantes ao aparecimento de uma doença.
Como a doença não existe em forma concreta, nosso corpo tenta reagir e enfraquece, abrindo brechas para contrair sintomas até então desconhecidos. Recomenda-se muito cuidado nessa hora, pois o problema pode atingir o coração.
O coração é um órgão vital, cuja função é bombear o sangue aos tecidos. Simples assim? Cientificamente o conceito está correto. Entretanto, quando o assunto é amor, desejo, paixão, ódio e todo tipo de sentimento que ultrapasse os limites da razão, o coração tem sentido simbólico daquilo que não pode ser controlado nem pelo intelecto nem pela vontade: nossas emoções.
Na literatura científica, já estão falando de um tipo de síndrome que aparece associada a situações de estresse físico ou emocional e que podem desencadear o início de um infarto agudo do miocárdio: dor menos intensa no peito, alterações no eletrocardiograma e nas enzimas cardíacas.
Nesse caso, as artérias coronárias apresentam-se sempre normais, sem obstruções, mediante o resultado do ecocardiograma e cinecoronariografia. Tal doença recebeu o nome metafórico de Síndrome do Coração Partido e surgiu no Japão, no início da década de 1990, com este nome porque suas imagens, quando realizado o cateterismo cardíaco, assemelham-se às armadilhas usadas pelos pescadores locais para apanhar polvos.
Entretanto, este quadro não é específico às decepções amorosas. Perder algum parente ou amigo querido em acidente, ou depois de passar muito tempo doente no leito hospitalar, receber a notícia de diagnóstico médico de uma doença fatal, perdas financeiras vultosas, situações de violência como assalto a mão armada, discussões acaloradas e até mesmo a emoção de uma festa surpresa podem desencadear um aumento significativo na frequência cardíaca e demanda metabólica cardíaca.
Segundo o médico residente em Cirurgia Geral, Guilherme Oliveira, além da adrenalina, o hormônio cortisol também é liberado em situação de alto estresse físico e mental, podendo acelerar o processo de formação de placas ateromatosas arteriais, dentre as quais, as artérias coronárias envolvidas na irrigação do músculo cardíaco.
Pesquisadores da Síndrome do Coração Partido descobriram que o transtorno atinge principalmente mulheres com idades acima de 65 anos, e raramente abaixo dos 50, com histórico de forte estresse físico ou emocional ou que tenham se submetido a uma cirurgia não cardíaca.
O caso de uma mulher de mais de 70 anos, que perdeu o filho com doença neurológica incurável, pode servir para ilustrar o sintoma da doença. De acordo com relato de parentes próximos, um ano após a morte do filho, esta senhora ficou muito deprimida, mas tentava levar uma vida aparentemente normal quando seu coração começou a fibrilar.
Para esclarecer o quadro, a paciente foi submetida a todos os exames cardiovasculares de rotina, inclusive cateterismo. Nada foi encontrado nos exames que justificasse a arritmia cardíaca.
Na ficção, a metáfora do coração partido é interpretada como o final de uma relação amorosa e chama atenção por ser passível de acontecer a qualquer pessoa na vida real. No cinema, Brooke Shields é estrela de Amor sem fim, uma história avassaladora de dois adolescentes que, consumidos pelo amor, levam seus desejos ao extremo. Ao ponto de um dos jovens ir parar no manicômio.
Na minissérie A casa das sete mulheres, Rosário (Mariana Ximenes) não se conforma com a morte de Estevão (Thiago Fragoso) e sua dor lhe tira a vontade de viver. A morte foi o caminho que encontrou para juntar o seu coração partido ao do amado que estava lá, do outro lado da vida.
Em Passione, Totó (Tony Ramos) é um homem maduro, porém mesmo sabendo que Clara (Mariana Ximenes) é uma vilã e não merece seu amor, ainda assim sofre profundamente ao romper seu casamento com a mulher.
Assim, para qualquer motivo que faça doer o coração os médicos recomendam distinguir a Síndrome do Coração Partido de um ataque cardíaco. Para que assim, as pessoas vitimizadas possam ser tratadas adequadamente e saibam que seus corações estão saudáveis, em vez de serem informadas de que padecem de uma doença coronária, e tomarem remédios para o coração por toda a vida.
Por Maria Oliveira
Publicado em Setembro de 2010
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