segunda-feira, 29 de março de 2010
Natal em família
Em Vila Valqueire, bairro onde me criei, está acontecendo um concurso da casa mais bem decorada para o Natal. Curiosamente, a mais cotada para vencer a competição é uma em que mora um casal e um filho. Ao justificarem o porquê de tantos enfeites, brinquedos e aparatos natalinos, num lar de uma só criança, os donos da casa foram categóricos: “é uma maneira de revivermos o Natal de nossa infância e dividirmos esta alegria com nossos vizinhos”.
Dividir! Eis a palavra mágica que sintetiza o espírito natalino, mas que está perdendo força, frente a novos paradigmas mercadológicos. A ordem agora é consumir, mesmo em meio à crise financeira mundial. Quando me vejo movida por essa lógica do consumismo, páro e reflito de modo a não desviar-me dos ensinamentos que recebi de meus pais sobre o sentido do Natal. Então, busco nas memórias de minha infância os natais que passei na casa de minha avó Cachopa, em Cacadura, a fim de perpetuar a tradição desta festa junto com meus filhos.
Lá, na casa da vovó, toda família se reunia em volta de uma mesa enorme repleta de pratos típicos trazidos pelas mulheres. Não havia bacalhau do Porto, nem vinho caro para acompanhar o frango assado com farofa. O cardápio principal era o prazer do encontro de todos os filhos, genros, tios, primos e netos. Na hora da ceia, os adultos intercalavam garfadas de comida com bocas cheias de piadas e risadas estridentes. A alegria contagiante dos mais velhos refletia nas crianças, que iam aprendendo o sentido da fraternidade. Este foi o legado mais importante que herdei da família Câmara.
Fraternidade significa laço de parentesco entre irmãos, união, afeto, amor ao próximo, mas também partilhar das idéias e convicções. Não existe família feliz sem esses ingredientes. Mas como transmitir para gerações futuras tais sentimentos, se as pessoas estão cada vez mais egoístas e fechadas num mundo vazio de solidariedade e de projetos humanitários? Hoje, os filhos não são prioridade na vida do casal, mas conseqüencia de um “ato impensado”. Se as famílias estão correndo da tarefa de se reunir para discutir responsabilidades do dia-a dia, não vão parar para dividir momentos felizes na noite de Natal. Família unida é coisa do passado, pode trazer problemas... E problema não faz parte do projeto de vida desta sociedade hedonista.
Se hedonismo é uma filosofia ligada aos prazeres da vida, a felicidade só pode vir da fé que nos move e nos dá esperança de uma vida melhor. E é essa esperança que nos alimenta todos os dias e nos faz crescer como seres humanos. Acreditar que o espírito de Natal ainda existe, é ter fé no amor. Mesmo que venha embrulhado em presentes sofisticados ou em sonoros cartões purpurizados, a essência da mensagem persiste em nos falar desse sentimento. Trata-se de um amor mais “descolado”, mais virtual, bem diferente daquele vindo no sapatinho colocado na janela ou no saco de Papai Noel descendo pela chaminé. Esse embalava nosso imaginário infantil e ficou em nossas lembranças. Mesmo assim, os pisca-piscas nas fachadas das casas são sinais de que as famílias ainda clamam por natais mais solidários, em que a harmonia seja uma constante festa cristã.
Feliz Natal para a família Espetaculosa e a todos os amigos que prestigiam nosso blog!
Por Maria Oliveira
Publicado em Dezembro de 2008
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